(A Realeza não é despotismo(1003-1066)
Eduardo e o reino
Imaginem agora a pessoa de Eduardo, que se tinha tornado um homem robusto, mas pacato, de cores sadias, mas com cabelos e barba de todo embranquecidas desde cedo, amante da caça, sobretudo com falcões, homem chegado ao próprio lar. Sem dúvida era inglês de nascimento, mas estava convencido da enorme superioridade da cultura normanda (o que não é de admirar!). Pensem agora que o reino parava por uma forte depressão da agricultura e por mudanças climáticas nada favoráveis, incluindo alguns grandes terremotos, que alarmaram a população, especialmente nos distritos de Derby e Worcester. Enquanto isto, os grandes senhores feudais e agressores constantes vindos do estrangeiro tornavam o horizonte muito carregado.
Vocês concluirão, sem dúvida, que, tal homem em tais circunstâncias jamais teria subido no palco da história. No entanto, ele se ergue luminoso sobre todos os seus contemporâneos. O fato mais notável é que, se os historiadores oficiais glorificaram seu reinado, sobretudo porque “inglês”, colocado entre a tirania dinamarquesa e a invasão normanda, a opinião pública raramente se engana quando julga, unida, o caráter de um chefe.
O afeto de um povo não se conquista facilmente ou, pelo menos, não se conquista de modo duradouro. Quando Eduardo morreu o povo o adorava e “às leis e costumes do bom rei Eduardo”, e que sempre para elas apelaram, várias vezes com sucesso, contra as opressões do invasor normando.
Como isto foi possível?
O caráter de um Homem
Acredito que só pode ter acontecido em virtude o caráter do homem, um caráter formado não na escola da permissividade, que não forma ninguém para coisa nenhuma, mas naquela do deliberado esquecimento de si próprio. Ele foi um verdadeiro rei exatamente porque não viveu para si mesmo, mas para o seu povo.
Sem dúvida poderia ter posto algum tipo de freio nos grandes senhores feudais, desde que fizesse morrer alguns quantos, mas não foi esta a política que adotou. Teria podido, talvez, ceder às exigências vindas do exterior e participar em guerras de expansão, mas só participou de uma guerra externa, a guerra em defesa de Malcolm, filho do mesmo escocês Duncan, que tinha sido assassinado em 1039, por Macbeth.
E, ainda uma vez, como é estranho que recordemos Eduardo não por causa dessa guerra, mas apesar dela! Não lhes parece? Talvez nenhum de nós tivesse ouvido falar de Macbeth, se Shakespeare não tivesse tido a inspiração de introduzir algum fragmento de sua história num trabalho de maravilhosa e potente fantasia. Milhões de pessoas terão lido ou assistido Macbeth sem sentir ou imaginar sequer que aquele rei fosse uma pessoa de carne e osso. Eduardo, porém, se sobressai no seu tempo sólido, vívido, verdadeiramente “vivo”!
Em uma época em que a corrupção e a extorsão eram parte da vida pública, Eduardo parece ter sido imune à atração do dinheiro. Assim revogou o imposto dos dinamarqueses (“Dane-geld”), que já durava 38 anos, e que constituía uma boa parte das rendas do soberano.
Quando alguns nobres, desejosos de fazer boa figura diante dele, lhe levaram uma grande soma, espremida de seus vassalos, ele a recusou e determinou que fosse devolvida aos contribuintes. Supondo que Eduardo tenha sido várias vezes enganado pelos homens nos quais depositava excessiva confiança, seu ideal sempre foi o de justiça nacional e pessoal.
Quando o Papa Leão IX, em 1049, consagrou a catedral de Rheims e ali celebrou um concílio, Eduardo enviou um bispo e dois abades, para que lhe comunicassem as resoluções conciliares para “o bem da cristandade”. Também mandou dois bispos ao concílio de Roma, como representantes dos bispos ingleses e seus pessoais. Os resultados foram inesperados e duram até hoje. Não somente os bispos regressaram com o anúncio de severas sanções contra os que tivessem pago suborno para obter cargos episcopais ou abaciais, mas ainda com a resposta a um escrúpulo que atormentava a consciência de Eduardo.
Naqueles tempos, todos os olhos se voltavam para Roma e Eduardo havia feito voto de peregrinar até lá. Feito rei, os nobres, temendo que sua partida servisse de pretexto par ao recomeço da guerra civil, o dissuadiam de deixar o reino. O Papa compreendeu a situação e o dispensou do voto, mas pediu que o dinheiro que Eduardo reunira para a viagem fosse dado aos pobres, e que ele se empenhasse em fundar ou restaurar uma abadia dedicada a São Pedro.
A abadia de Westminster
Daí por diante, o rei colocou à parte um décimo das rendas de suas terras para esta obra: a abadia de Westminster. Seus sucessores e arquitetos mal inspirados acrescentaram ao edifício original várias alas, incluindo duas torres muito feias. Mas o mérito principal vai para Eduardo e o Papa Leão IX.
Eduardo foi a Londres para a consagração da igreja, quase concluída, mas, na vigília do Natal, teve um ataque de febre, Sereno, como sempre, tomou parte às funções do dia e deu instruções a sua esposa, Edite, para a decoração do templo. No dia 28 de setembro, ela o representou nas cerimônias realizadas na nova abadia, quando, Alfredo, arcebispo de York, teve confirmados pelos legados do Papa muitos privilégios, concedidos quando de sua ida a Roma.
Eduardo morreu no dia 5 de janeiro de 1066, e por causa do costume de estudar a história inglesa apenas a partir da segunda metade daquele ano, Eduardo, cuja figura é tão insigne, é habitualmente designado como “um monarca do período anterior à conquista”.
Foi sepultado na abadia. A tapeçaria de Bayeux, do século XI, reproduz a cena. A capela, onde repousam suas relíquias, escapou a muitos perigos, e foi restaurada e embelezada por Eduardo VII e por outros monarcas da família agora reinante.
No dia 13 de outubro de cada ano, aniversário do translado solene dos seus restos mortais para essa capela, sob a presidência pelo arcebispo de Cantuária, São Tomás Becket, mártir, na presença do rei Henrique II, onde ficou exposta à veneração do povo, ainda se pode ver uma pequena multidão devota de joelhos em torno ao seu túmulo.
A herança de Eduardo
Como vocês sabem, um cristão não é obrigado, por ser cristão, a preferir uma forma de governo a outra: monarquia, parlamentarismo, presidencialismo... Mas como São Paulo deixou à Inglaterra e ao mundo mais do que uma catedral com sua cúpola, assim Eduardo deixou, como legado, mais do que sua abadia.
Ele acolheu em si e demonstrou ao mundo dois elementos essenciais de uma justa autoridade:
1. A verdade que toda autoridade deriva, essencialmente de Deus;2. e que todos os governos existem para o bem estar dos governados, não para ao próprio.
O cristianismo não empenha os cristão a julgarem uma forma de governo melhor do que a outra. O cristão se opõe, contudo, à anarquia. O cristão se opõe a ela, como, aliás, é do dever de toda pessoa (...) Sabe também que toda autoridade deriva de Deus. Esquecê-lo é começar a dar a César o que é de Deus, a venerar a Besta e a seu Ídolo (...) Não há Estado ou governo que possa ter autoridade absoluta sobre as consciências. E nenhum governo, nem sequer na família, nas empresas existe para o benefício dos que o exercem. Nenhum governo ou patrão pode desfrutar de nenhuma pessoa, seja de que raça for. Os governados devem obediência, mas não devem aceitar tornarem-se escravos.
Possam estes princípios que fizeram de Eduardo um rei e um santo, permanecer. Seus castelos não existem mais, porém ficou de pé sua abadia. Que permaneçam as realidades que ela simboliza, tendo valor para nós, tenham renovado vigor. De outro modo perderemos toda regra legítima dos povos, imagem na terra do reino de Deus. Possa o Reino vir, inteiramente e para sempre.
Ele acolheu em si e demonstrou ao mundo dois elementos essenciais de uma justa autoridade:
1. A verdade que toda autoridade deriva, essencialmente de Deus;2. e que todos os governos existem para o bem estar dos governados, não para ao próprio.
O cristianismo não empenha os cristão a julgarem uma forma de governo melhor do que a outra. O cristão se opõe, contudo, à anarquia. O cristão se opõe a ela, como, aliás, é do dever de toda pessoa (...) Sabe também que toda autoridade deriva de Deus. Esquecê-lo é começar a dar a César o que é de Deus, a venerar a Besta e a seu Ídolo (...) Não há Estado ou governo que possa ter autoridade absoluta sobre as consciências. E nenhum governo, nem sequer na família, nas empresas existe para o benefício dos que o exercem. Nenhum governo ou patrão pode desfrutar de nenhuma pessoa, seja de que raça for. Os governados devem obediência, mas não devem aceitar tornarem-se escravos.
Possam estes princípios que fizeram de Eduardo um rei e um santo, permanecer. Seus castelos não existem mais, porém ficou de pé sua abadia. Que permaneçam as realidades que ela simboliza, tendo valor para nós, tenham renovado vigor. De outro modo perderemos toda regra legítima dos povos, imagem na terra do reino de Deus. Possa o Reino vir, inteiramente e para sempre.